Rio - Os sachês de açúcar em cima da mesa do restaurante vão parar no bolso entre uma frase e outra sobre sexismo. “É para enganar a fome. Vivemos de doações. Então, quase sempre estamos duras”, dispara, sem constrangimento, Sara Winter — nascida Sara Fernanda — 20 anos, fundadora do Femen Brazil.
A jovem, que debutou como ativista no Rio invadindo o Copacabana Palace aos gritos de “O Brasil não é bordel”, agora será moradora da Zona Norte. Lá, no subúrbio, em bairro ainda não definido, o quartel-general do feminismo moderno vai montar suas bases.
No Brasil, o movimento tem 15 ativistas do topless, mas Sara, que tem ficha corrida na polícia com seis passagens, quer mais. Em média, o Femen recebe por semana dez e-mails de garotas interessadas em se tornar uma soldada — como chamam umas às outras.
Foto: Alexandre Vieira / Agência O Dia
Voluntárias — ou “soldadas” — do Movimento Feminista Femen Brazil, que terá sede na Zona Norte do Rio. Disposição para vida dura, sem perder a compostura e não sorrir jamais | Foto: Alexandre Vieira / Agência O Dia
A maioria desiste quando ouve que precisa mostrar os seios e se manter plácida diante de solavancos e “gravatas” de policiais e seguranças particulares durante as manifestações contra o turismo sexual, o machismo e a violência à mulher.
“Oferecemos treinamento moral, psicológico e físico. A garota tem que estar preparada para uma mudança radical. Um dia ela tem casa, trabalho, namorado. No outro, estará gritando, pelada, na rua, com um cartaz na mão. E, claro, terá sua foto estampada em sites e jornais”, explica a loura, que virou espécie de celebridade. É impossível andar ao lado dela sem ter que parar para uma foto.
O manual de postura de uma ativista do Femen é extenso: nunca sorrir para fotógrafo no protesto, fazer cara de brava quando segurar o cartaz ou gritar, nunca abaixar a cabeça quando for pega e, se sentir dor, não chorar. Não há restrição à vida afetiva, mas a jovem terá que ter disposição para dormir em qualquer lugar — ou não dormir — ficar sem se alimentar bem e migrar a qualquer hora.
Neofeministas enfrentam rejeição por causa do topless
No Rio, que usa e abusa da falta de roupa no Carnaval, o topless das garotas do Femen é a principal crítica ao movimento. Mas não é a única. O passado de Sara Winter, que foi garota de programa em São Paulo por dez meses, também pesa no discurso de rejeição às neofeministas.
“Foi a maneira que encontrei para pagar minha faculdade de Relações Internacionais e um apartamento na capital. Ganhava R$ 4 mil por mês. Quando você é jovem e pobre, fica viciada em dinheiro. Achava que estava rica”, conta Sara Winter, que desistiu da prostituição após ser agredida por um cliente.
Um dos braços direitos de Sara é a mineira Anna, 19. As duas são as responsáveis em transformar a sede do Femen na Zona Norte numa casa de cultura e atendimento a mulheres vítimas de violência: “Deixei casa e família para trás e não me arrependo. Defendo o movimento, porque acredito que podemos fazer um mundo mais justo.”

Fonte: ODIA